Ela é responsável pelo maior boom
de visitas do RQA. Não é difícil apontar o motivo: sua capacidade de
gerar polêmica e ferir os olhos dos moralistas retrógrados com sua nudez
ousada que, para ela, é natural. E é com essa naturalidade, sinceridade
e autenticidade que Enoli Lara, conhecida
nacionalmente pelo processo milionário de uso indevido de imagem de seu
bumbum e com sua nudez total no carnaval, que respondeu às minhas
perguntas. Da mesma forma que já apareceu nua na revista, ela agora
aparece nua em palavras, demasiadamente reveladora. Minha tentativa de
defini-la é em vão. Só digo que, por trás da imagem de superpantera, há
uma mulher de espantosa inteligência, conflitante com suas formas
exuberantes.
Facetas desconhecidas de Enoli: artista plástica e mãe
-
De alguma forma te incomoda à associação que as pessoas fazem da Enoli
Lara à polêmica, sem conhecerem seu lado atriz e sua literatura, ou tem
consciência de que foi o que lhe alçou à fama e como sempre será
lembrada?
EL: Minha vida é regida por duas
frases: "Você que já foi ousada não permita que a amansem" (Isadora
Duncan, dançarina dionisíaca). "Meu interesse não está em agradar, mas
em surpreender e provocar" (Maurice Béjart, coreógrafo francês).
Gostaria que meu lado intelectual sobrepujasse o físico, mas acredito
que agora isso possa acontecer. Infelizmente a nossa sociedade é
puritana, cheia de falso pudor. Se a mulher é bonita, não pode ser
inteligente; se é erótica, deve ser vazia, oportunista etc. Eu tive uma
adolescência religiosa e casei aos 18 anos. Aos 20 anos me separei,
contra a vontade dos pais. Já era mãe e conheci o meu segundo marido, 40
anos mais velho que eu, o célebre artista plástico e homem de sociedade
Edgar Duvivier, um gênio na arte e um mestre no amor. Fui mulher, aluna
e modelos de suas obras. O Bumbum ficou eternizado em mármore e bronze.
Com certeza o bumbum foi minha marca registrada. Não porque era
perfeito ou por exibição, mas ao me separar, posei para fotos e uma
delas, foi usada em horário nobre na TV, antes do Jornal Nacional,
durante dois anos, numa propaganda do Banerj. Com esse
processo, único no mundo por uso indevido de imagem, no caso o bumbum.
Abri um precedente na lei e passei para os anais da jurisprudência
brasileira. Ganhei o processo através de um acordo, com a ré, a empresa Globotec.
A TV Globo veiculou o comercial, mas movi o processo contra a empresa
que prestava serviços para ela. Depois veio a nudez do Carnaval, em
1988, levei para a Avenida o corpo nu pintado, como uma tela, em
vermelho e preto, era a rainha do C.R. Flamengo, no enredo "Aquarela do
Brasil", na ES.S União da Ilha do Governador. Em 1989, EXIBI A NUDEZ
TOTAL, COMO AFRODITE, NA "FESTA PROFANA", na mesma ES.S União da Ilha do
Governador. Com isso gerei a proibição do nu no carnaval, fui a
geratriz da Genitália Desnuda, proibida desde 1990.
Aterrissagens polêmicas na Marquês de Sapucaí
-
Você é uma mulher que sempre fez questão de enfatizar que nunca foi
reprimida sexualmente. Acha que as pessoas recriminam uma mulher madura
que declara ser liberal e que verbaliza os prazeres da carne?
EL:
Ao esculpir, escrever, atuar, usufruo de inefável prazer, o orgasmo
transcendental, que possui a mesma carga erótica que o orgasmo sexual.
Mesclo períodos de abstinência e de exuberância sexual. Fui muito
reprimida pela educação religiosa da família, mas sempre deixei fluir o
erotismo, que é como linfa, sai pelos poros. Sou epicurista, tudo pelo
prazer. Meu erotismo como um ato prometeico, roubando o fogo divino da
imaginação para beneficiar a humanidade, enfrentará a punição, o
suplício inexorável. A maioria das pessoas, principalmente as mulheres
tem dificuldade em liberar e exibir a sua sensualidade e sexualidade.
Algumas alegam fotografarem nuas só pelo dinheiro. Eu me denomino "A
mística do nu" (nome do meu vídeo que deu origem ao vídeo Playboy
Paixão...). Adoro estar nua, faço as fotos prazerosa e orgasticamente. A
vida toda servimos a dois senhores: Senhor do Prazer e Senhor do
Sofrimento. Prefiro ser arauto da alegria e do prazer. Como qualquer
mortal, tenho meus momentos de sofrimento, mas vivencio sozinha, anonima
e silenciosamente. É evidente que já perdi parte de meu patrimônio
financeiro, por ingenuidade, como em campanha política em 1992,
distribuindo camisinhas e lutando pela inclusão da educação sexual nas
escolas. Perdi apartamentos, ao separar de maridos, ou amores com quem
não sentia mais desejo.
Cercada de luxos
Provocante ensaio assinado pelo partner-fotógrafo Fernando Cussate
-
Recentemente você protagonizou um ensaio apimentado em Ipanema. Por
trás do intuito de divulgação, foi uma oportunidade de inflar o ego,
mostrar como está bem fisicamente e receber elogios?
EL:
Eu estava totalmente envolvida com o meu livro, nunca gostei de malhar,
a não ser aulas de alongamento e agora aulas de core trainning (com
bola) na academia Ipanema 24 horas, onde encontro amigas famosas e
amigos de imprensa etc. Só fiz uma cirurgia plástica, há 15 anos,
próteses nos seios, que eu já deveria ter trocado. Digo que está em
queda livre. Eu estava na praia, relendo o livro e me dourando ao sol
com um amigo, o magnífico fotógrafo Wagner Carvalho. O mar estava
agitado e impróprio para o banho. A praia estava vazia e resolvemos
brincar de fotografar, já que eu não havia me preparado, nem com
produção. Eu estava assustada à beira d'água, as ondas me arrastavam e o
helicóptero do Corpo de Bombeiros sobrevoou o local, pensando tratar-se
de um afogamento. Cheguei a me afogar, mas como estava no raso, nada
sofri. Passado o tumulto, ele fez algumas fotos mais sensuais na areia.
Solicitei a ele que não mostrasse as fotos para ninguém, pois deviam
estar engraçadas. Eu acreditava não estar "bem na foto". Uma semana
depois, ele me ligou e pediu para acessar o site Ego. Confio no trabalho
dele, pois já clicou as mais famosas e poderosas musas, atrizes de
todas as idades. Ele faz a foto sem precisar perder muito tempo
corrigindo. Para alguém como eu que fotografou sem retoques, mesmo
porque não existia certas facilidades como hoje, ainda não estou dando
muito trabalho ao fotógrafo. Tenho uma empatia com a câmera, sei me
posicionar e como disse, acho um prazer, uma delícia estar nua ou
seminua, principalmente com pessoas olhando. Sou exibicionista. Lógico
que muita gente se aproximou quando começamos a fotografar. Costumo
dizer que tenho tudo original de fábrica, exceto as próteses de seios,
mas não tenho implante de cabelos, unhas postiças etc, como a maioria
delas. Na verdade, fiz sempre sexo com qualidade, mais que quantidade.
Passei a maior parte da minha vida casada e aos 35 anos saí do
anonimato, por mero acaso. A foto usada na TV, a do bumbum clicado na
praia, sem a minha autorização, usando um biquíni da Yez Brasil,
posando para as lentes do fotógrafo Gervázio Batista para a revista
Manchete deu origem a tudo. Na época, nem havia essa febre de academias,
quem tinha o corpo perfeito era natural, original, esculpido pelo
Criador.
Entregue ao mar, naturalmente
-
Em entrevista, você disse ter o desejo de posar nua aos 60 anos. Quais
são as suas idéias para esse ensaio, se pudesse escolher cada detalhe?
EL:
Um dos meus sonhos é fotografar nua. Nos Estados Unidos, algumas
playmates fotografaram aos 50 e 60 anos. No Brasil não é comum isso
acontecer. Quero quebrar esse tabu também. Já estou fazendo alguns
ensaios, pretendo reviver alguns mitos da história: rainhas, mulheres
ousadas e libertárias, revolucionárias, transgressoras como Cleópatra,
Salomé, Messalina, Joana D'Arc, Luz Del Fuego etc. Sonho com um ensaio
erótico a bordo de uma nave, pois a lei da gravidade é diferente. Como
seria a acoplagem? Já fiz sexo de quase todas as maneiras, esse seria
inédito. Sou extremamente performática, tenho alongamento de ginasta
olímpica, sou um caso sério em variar posições, não seria difícil.
O mítico bumbum por Ernani D'Almeida
Foto carinhosamente intitulada por ela de "pão-de-mel"
- Se orgulha em estar do time da PLAYBOY, onde as mais importantes e interessantes mulheres do país apareceram nuas?
EL:
É magnífico fazer parte do time da Playboy. É o sonho de toda a mulher.
Já tive convite de outras revistas, mas nunca fechei, sempre tive a
expectativa de voltar a fotografar para a poderosa revista Playboy, eu
que fui a única brasileira a participar de um vídeo da Playboy americana
com segmento nacional com imagens das playmates e da Deusa mítica, a
maior de todos os tempos: Marilyn Monroe. Acredito que se fizesse um
novo ensaio, venderia muito, pois o site Ego, como dizem, bombou. Acho
que fui mais requisitada do que quando tinha 20 anos. Propostas de
namoro, fãs aficionados, pedidos de fotos, propostas indecentes etc.
Acho maravilhoso num país como o Brasil isso acontecer.
Ensaio para a PLAYBOY em 1986
- Tem guardadas suas edições e vídeo feitos para a revista?
EL:
Tenho a revista Playboy, edições dos mais belos bumbuns da Playboy e
das 200 mulheres da Playboy e o vídeo, único lançado no Brasil, "Playboy
Paixão Nacional: Enoli Lara, um bumbum de 40 mil dólares”. Fiz, também,
a revista italiana Max.
Vídeo Paixão Nacional lançado em 1989
- Quem vê suas fotos, percebe uma entrega, um sentimento, um propósito. Acha isso fundamental numa foto de nu?
EL:
"A nudez era a única maneira de mostrar como a sua alma estava livre
naquele momento" (Paulo Coelho em Brida). "O libertino está mais próximo
dos santos que o homem sem desejo" (Bataille - O Erotismo). É um
exercício de Amor para consigo mesmo e para os outros. Embora
fetichista, gosto de acessórios que exibam uma nudez velada. Até ao
fazer as minhas orações, fico ajoelhada nua, durmo nua e ando nua pela
casa, mas sempre de saltos altos. Ao fazer amor uso espartilhos, meias
de seda, scarpins. Às vezes vestidos esvoaçantes, sem calcinha. Tenho
uma mania, desde adolescente: levo sempre na bolsa duas calcinhas
sobressalentes, além da que eu estiver usando. Assim como cremes,
perfumes etc. Sou o outdoor da nudez implícita e explícita. Estreei na
Avenida a nudez frontal e total do Carnaval. Tudo o que fiz na minha
vida, eu mesma criei, idealizei, de modo catártico, em insites, não
premeditado, mas instintivamente. Às vezes pareço reviver vidas
passadas, como escrevi na minha biografia erótica. Algumas pessoas dizem
se liberar após beber um pouquinho, ou usar algo, mas eu adoro estar
lúcida para usufruir do prazer da exibição. Sou 99% exibicionista e só
sou voyeur de mim mesma. Tento manter a harmonia da tríade: corpo, mente
e espírito. Não sou adepta de nada que alterem o comportamento. Sou
radicalmente contra as drogas e desvios sexuais, como sadomasoquismo
etc.
Clicada por Ricardo Cânfora em 1992
-
Embora tenha declarado que não deseja mais alimentar seu lado sensual
publicamente pelo filho, seu livro, que em breve será lançado, é cheio
de passagens-bomba de cunho sexual e apareceu seminua na TV. Isso não é
contraditório?
EL: O meu livro é
nitroglicerina pura! Contudo não expõe ninguém. Os leitores irão se
surpreender: não contem pornografia, é literatura erótica. Vou fazer jus
ao apelido da maravilhosa jornalista Hildegard Angel: "Enoli Lara, um
bumbum pensante". Não tenho assessoria, padrinho ou patrocínio, por isso
no programa Superpop, me adequei ao programa e recebi algumas críticas
negativas. Não me arrependo, pelo contrário, foi altamente positivo e
produtivo. Tenho sido assediada por homens e mulheres, fãs e
admiradores. Prefiro a mídia da ousadia, da transgressão positiva do que
se a exposição por doenças terminais, envolvimento com drogas ou
paixões fatais. Respeito todas as pessoas que passam por esses
sofrimentos, mas graças a Deus tenho privilégio de nesse momento ser a
voz da luxúria e do prazer. Infelizmente a humanidade é mórbida, se
mobiliza mais com a desgraça alheia e como não tem a afinidade com seu
lado erótico, ou não ousam revelar suas fantasias, se sentem incomodadas
com quem sabe lidar com a verdade da sua sexualidade saudável.
Capa do livro que faz tributo ao prazer
-
Estou correto ao afirmar que você foi uma das precursoras nesse estilo
de carreira artística voltada para o marketing no Brasil?
EL:
Nunca fiz marketing nem nunca soube fazê-lo. Ao contrário profissionais
da área, já me disseram que eu sou boa de marketing, mas não sei tirar
proveito, ou melhor, não sei auferir lucros. Embora lúcida, não
premedito obter vantagem financeira, busco a própria satisfação pessoal.
Procuro não agredir nem chocar, só levar a mensagem positivista para o
próximo. Sou a precursora da nudez do carnaval, a pioneira do uso
indevido de imagem do bumbum, fui mito após os 30 anos, fui única mulher
a fazer campanha política pregando o sexo seguro e distribuir
camisinhas (1992). Estreei o primeiro programa erótico nas tardes da TV,
"A mística do nu" (1990). Lancei a primeira coluna erótica, apadrinhada
pelo cartunista e jornalista Jaguar, no jornal "A Notícia" - "Transando
com Enoli" (1990-1992), sobre sexo seguro e jogo erótico como forma de
saúde e prazer. Gravei uma musica orgânica (1997), um rap, um orgasmo
com instrumentos de percussão que foi proibido no programa da Hebe, pois
ela estava sob censura, por causa dos Anões do orçamento. Habituada ao
viver bem, ao luxo, hoje tenho enfrentado adversidades, mas não negocio a
minha liberdade, o meu sonho a minha verdade. Até no meio artístico
tenho dificuldades, sou discriminada em certas ocasiões, enquanto amigas
minhas algumas casadas e que se passam por santas dizem que deitam na
cama e eu é que levo a fama... O fantástico é que reencontrei amores de
20 e 15 anos atrás e desejaram um revival e, se dependesse deles,
adorariam ficar comigo, e olha que são mais jovens que eu: um tem 45 e
outro, 32. Tenho fãs de 20 anos e sou assediada por homens entre 30 e 40
anos. Tenho um grave defeito: sou teúda e manteúda, não saberia dividir
a conta, me corta o tesão. Adoro ser presenteada, com livros e jóias.
Já recebi jóias dentro de livros. Um luxo!
“Sempre encarei o corpo como a imagem do espírito. Deus nos fez à sua imagem e semelhança, nascemos nus.”
“O
erotismo está presente em algumas imagens sacras, em que não se vê as
mãos, mas a fisionomia de prazer é equivalente a um momento de orgasmo.”
- Daqui pra frente, o que almeja a Enoli Lara, profissionalmente e pessoalmente?
EL:
Lançar a minha autobiografia erótica "Trilogia do Prazer - carnaval,
futebol e sexo”. Lançar um CD "A voz da bola" com crônicas eróticas
sobre futebol. Estou escrevendo o romance "Amantes de Alma". Fiz um
curtametragem "A Interrupção" com atriz Antonia Fontenelle. Estou
participando de outro curtametragem "Operação Mamãe", dirigido por
Marise Farias, filha do diretor Roberto Farias, escrita por Marina
Freitas, e no elenco Catarina Abdalla e Marilu Bueno. É uma comédia. Vou
montar o musical "Enoli no país onde tudo abunda", texto do Nani,
redator de Zorra Total e Sai de Baixo. Já recebi proposta para um
longametragem sobre a minha vida como pin-up brasileira e algumas
propostas para filmes pornôs. O que mais adoro fazer é locução, pois o
que tenho de mais erótico é a minha voz, que é imperiosa e gozosa. Ela,
sim, sobreviverá à lei da gravidade. Tenho um filho, Jefferson, 38 anos,
teólogo e professor de Criacionismo, casado, que além das alegrias que
me dá, poderá me tornar uma vovó gostosa, mas por hora, sem previsão de
acontecer. Desejo trabalhar como atriz na TV e nem me importo de fazer
bruxas, personagens sem glamour e sensualidade. Fazer cinema erótico ou
não. Um programa de TV erótico com esclarecimentos, turismo, dicas de
arte, tudo voltado para o erotismo. Já fiz um piloto, estou à espera de
patrocínio. Estou com a "figura na medina". A espera de um cúmplice para
viajar, ouvir boa música, dançar e fazer amor e sexo, todos os dias que
Deus me conceder, ainda para viver sob o sol na face da Terra.
"Sou Afrodite, nascida da espuma do mar, do sêmem de Urano."